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Como o isolamento social impacta quem sofre com ansiedade ou depressão

O Sars-CoV-2, vírus causador da Covid-19, definitivamente não atinge apenas quem contrai a doença causada pelo novo coronavírus. Até que uma vacina ou medicamento seja desenvolvido, o método mais eficaz encontrado pelas autoridades para combater a disseminação do vírus é o combo medidas de higiene e distanciamento social — que, sim, salva muitas vidas, mas também atrapalha a saúde emocional de muita gente.

Claro que ficar longe do trabalho, dos amigos e até mesmo de familiares impacta todo mundo. “Esse é um período de luto coletivo em que é preciso ressignificar as necessidades e os valores da vida. Isso vem associado à angústia da incerteza financeira e ao medo da contaminação”, analisa o psicanalista Ronaldo Coelho, do canal Conversa Psi, no YouTube. Sem contar que a ansiedade, quando controlada, é um mecanismo de reação diante de situações de perigo, funcionando como um estado de alerta para que a pessoa saiba como agir.

O problema é quando essas condições emocionais saem do controle: nesses casos, a situação de isolamento social pode ser pior ainda. Aqueles que já sofrem com transtornos como depressão, bipolaridade e ansiedade crônica percebem a solidão e as tensões causadas pela pandemia de forma muito mais intensa. Falta de apetite, dificuldade para dormir e ausência de concentração são algumas das chateações vividas pelo advogado R.G*, de 27 anos, nas últimas semanas. “Ainda preciso trabalhar, mas não consigo fazer outras coisas além disso. É difícil focar em algo sabendo que há um caos lá fora”, relata.

Um estudo preliminar (que ainda não foi revisado por outros pesquisadores antes da publicação) das universidades Swansea e de Manchester, ambas no Reino Unido, feito com britânicos maiores de 18 anos de idade, alerta para um aumento significativo dos sentimentos de ansiedade e depressão durante a pandemia de Covid-19, especialmente entre aqueles em situação financeira ou social mais vulnerável.

No Brasil, o cenário também é preocupante. Por aqui, 11,5 milhões de pessoas sofrem com problemas de depressão, de acordo com dados apresentados em 2017 pela Organização Mundial da Saúde (OMS). E a pandemia pode aumentar ainda mais esse contingente. Uma pesquisa com 1.460 brasileiros, coordenada pelo psicólogo Alberto Filgueiras, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), mostra que os sintomas de ansiedade e depressão duplicaram no país em apenas um mês de quarentena. Na primeira semana do estudo, entre 18 e 22 de março, a prevalência de sintomas de ansiedade e depressão entre os participantes era de 4,2%; já entre 15 e 20 de abril, esse índice subiu para 8%.

O estudo, publicado em pré-print (ainda não revisado), aponta também que os grupos com saúde mental mais frágil são as pessoas que precisam sair de suas casas para trabalhar, aqueles que convivem com idosos e também quem mudou hábitos alimentares e físicos repentinamente. A boa notícia é que dá para adotar medidas que ajudem a minimizar ou mesmo prevenir a situação. “Foi possível verificar que aqueles que mantêm uma alimentação saudável, fazem terapia online e praticam exercícios físicos de três a quatro vezes por semana são menos propensos a ter sintomas de ansiedade e depressão”, afirma Filgueiras.

Outro artigo, este publicado no último dia 10 de abril no respeitado periódico Jama Psychiatry, alerta que o isolamento pode aumentar os índices de suicídio. Segundo os autores, vinculados a universidades e instituições de saúde norte-americanas, diversas teorias enfatizam o papel das relações sociais na prevenção do suicídio. “Pensamentos e comportamentos suicidas são associados a isolamento social e solidão”, escrevem os pesquisadores. Ficar longe de tudo e de todos, portanto, pode ser ainda mais perigoso para pessoas sob risco de tirarem a própria vida.

Atenção aos idosos
A fragilidade da saúde mental entre os idosos também preocupa. Não é à toa, já que são o principal grupo de risco para a Covid-19. O medo da morte iminente e a distância da família são os fatores principais dessa vulnerabilidade. Além disso, a ideia de finitude, já presente no pensamento de muitos na terceira idade, se intensifica.

Segundo a médica geriatra Maisa Kairalla, coordenadora da Comissão Especial COVID-19 da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, a recomendação é prestar atenção em falas e olhares das pessoas mais velhas a fim de detectar qualquer sinal de risco. O que não significa, é claro, omitir informações sobre o que está acontecendo. “Conversar por telefone, por vídeo e manter esse contato mais vezes ao dia é essencial para fortalecer esse grupo. O incentivo de atividades e do otimismo também são parte do tratamento, pois ajudam essas pessoas a atravessarem os momentos difíceis”, orienta Kairalla.

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